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Uber defende regulação com benefícios, mas sem vínculo de emprego no país

Publicado originalmente em conjur.com.br

A Uber defende que a criação de arranjos regulatórios específicos para os serviços por aplicativos, como o que ela presta, é um caminho promissor para diminuir as discussões judiciais. A empresa, que integra um grupo de trabalho do governo federal, defende benefícios mínimos aos motoristas, mas que não resultem em vínculo de emprego.

“Não há incompatibilidade entre a atividade em plataforma com políticas sociais de trabalho, mas, para torná-las efetivas, vai ser preciso vencer o desafio de harmonizá-las nesse ambiente”, disse Ricardo Leite Ribeiro, diretor de Políticas Públicas e Relações Governamentais da Uber no Brasil, nesta terça-feira (27/6), durante o painel de encerramento do segundo dia do XI Fórum Jurídico de Lisboa.

“Acreditamos que é bem-vinda uma regulamentação específica do trabalho em plataforma no Brasil. Isso se ela conseguir se guiar no sentido de garantir o acesso a esses direitos, à proteção e aos benefícios a esses trabalhadores, sem prejudicar a liberdade e flexibilidade de que eles gozam hoje”, afirmou ele.

Na avaliação de Ribeiro, a regulação vai conseguir frear o crescimento exponencial dos litígios sobre o tema no Judiciário brasileiro. Só a Uber tem mais de 15 mil ações em curso no país. No Tribunal Superior do Trabalho, são ao menos 500 processos.

O diretor da empresa defendeu que cada país deve ter uma regulamentação específica para sua realidade — cerca de 20% dos trabalhadores cadastrados na plataforma em todo o mundo são brasileiros (cerca de um milhão de motoristas). Ele lembrou que, desde que começou a operar no país, a empresa foi submetida diversas vezes ao escrutínio judicial.

“Do nosso ponto de vista, é importante reconhecer que não necessariamente esse modelo é uma obra acabada, que não caibam melhorias de ordem regulatória. É um fato real, e a Uber reconhece isso, que o trabalho por meio de aplicativos desafia os arranjos tradicionais de políticas de proteção social do trabalhador, que não foram projetadas para lidar com essa dinâmica.”

O diretor da Uber disse que cidades e países que reconheceram a existência de vínculo empregatício entre os aplicativos e os motoristas não alcançaram resultados positivos. Ele citou o caso de Genebra, na Suíça, que regulamentou a atividade dessa forma em 2020. Segundo ele, a cidade teve a oferta de entregadores reduzida em 50%. Enquanto isso, na também suíça Lausanne, houve movimento contrário, mais do que dobrando o número de trabalhadores.

Proteções
Para Gilberto Carvalho, secretário nacional de Economia Popular e Solidária do Ministério do Trabalho, o debate sobre a existência de vínculo empregatício entre entregadores e motoristas e as plataformas digitais se apresenta em um momento dramático pelas características dos desafios impostos às empresas, à sociedade e ao governo.

“Estamos diante de uma nova fronteira, de uma revolução tecnológica onde o capital muda sua face, sua forma de atuação, assim como ocorreu a financeirização do capital em todo o mundo. É uma revolução bem-vinda, auspiciosa para a sociedade, mas para quem vai servir essa revolução?”, questionou ele.

O secretário acredita que o debate levado aos tribunais é uma grande oportunidade para empresas, governo e trabalhadores buscarem novas formas de contratação. No entanto, ele defende que direitos trabalhistas básicos devem ser levados em consideração. “É preciso construir um processo de seguridade social, com métodos de segurança e saúde, de uma jornada definida. Não é possível compreender uma jornada de 12 a 14 horas quando a classe trabalhadora lutou por anos para construir as oito horas. Não é possível pensar que não existem férias e descanso remunerado.”

O vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gustavo Gonet Branco, destacou que a discussão sobre o vínculo de emprego gira principalmente em torno da possibilidade de subordinação entre os trabalhadores e os aplicativos. Ele citou que a Justiça brasileira, tanto a comum quanto a Trabalhista, tomou uma sequência de decisões divergentes sobre essa questão. O vice-PGE citou uma conversa com uma motorista de aplicativo que teve antes de participar do evento em Lisboa, em que ela se queixou de decisões tomadas pela plataforma sem consultar os trabalhadores.

“Não temos de fazer as pessoas felizes à força. É melhor confiar também na autonomia delas. Quando se vai regular um assunto de tamanha complexidade, não se pode deixar de ouvir os maiores interessados, que são aqueles a quem se pretende proteger”, disse Gonet Branco.

Professor do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa e do Insper, João Paulo Bachur disse que a solução não pode surgir de uma discussão binária — “Ou isso ou aquilo”. Para ele, o debate deve levar em conta características dos trabalhadores, que, segundo pesquisas, muitas vezes optam individualmente pelo serviço por aplicativo como complemento de renda. “Se a gente adota um modelo muito rígido, engessado, a base de trabalhadores pode enxugar e termos um efeito perverso com isso.”

O painel “Plataformização do trabalho e gig-workers” foi mediado pelo presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), Fernando Braga Damasceno.

O evento
Esta edição do Fórum Jurídico de Lisboa tem como mote principal “Governança e Constitucionalismo Digital”. O evento é organizado pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), pelo Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (ICJP) e pelo Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da FGV Conhecimento (CIAPJ/FGV)

Ao longo de três dias, a programação conta com 12 painéis e 22 mesas de discussão sobre temas da maior relevância para os estudos atuais do Direito — entre eles debates sobre mudanças climáticas, desafios da inteligência artificial, eficácia da recuperação judicial no Brasil e meios alternativos de resolução de conflitos.

Confira aqui a programação completa

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