O termo “assédio moral” não está presente na legislação trabalhista ou em qualquer norma federal, mas vem ganhando cada vez mais espaço nos tribunais brasileiros, na maioria das vezes com ganho para o trabalhador. Até abril, pelo menos 12 casos relativos ao tema – o primeiro em 2002 – tinham sido julgados pelos Tribunais Regionais do Trabalho (TRT’s). Segundo um levantamento realizado pela advogada Adriana Calvo, dos 12 processos, em apenas um o trabalhador não teve reconhecido o direito à indenização. Nos demais, as empresas foram condenadas a pagar aos ex-empregados valores que variaram de R$ 5 mil a R$ 40 mil. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) ainda não julgou nenhum caso de assédio moral. Os motivos das condenações são inúmeros e vão desde a cobrança exagerada de produtividade do empregado, com a ameaça de demissão, até exigência da realização de exame psiquiátrico do empregado, classificado “fora dos padrões”, por ser calado. Em um dos recursos julgados pelo TRT de Minas Gerais, por exemplo, uma empregada obteve uma indenização de R$ 25 mil. Ela ficou afastada algum tempo do emprego por problemas de saúde, mas todas as vezes que comparecia ao ambulatório da empresa para acompanhamento, era seguida por seguranças e não podia parar em outros setores da fábrica. O TRT mineiro entendeu que a empregada sofreu perseguição física e discriminação, tornando-se alvo de deboche, humilhação e chegando mesmo a despertar compaixão nos colegas.
Em um outro processo, o TRT de Minas determinou o pagamento de R$ 20 mil a um empregado que sofria ameça de demissão pelo não-cumprimento de metas. A chefia do banco no qual trabalhava enviava e-mails com dizeres como “parece que você não precisa do emprego” para o empregado que não cumpriu a meta de aberturas de contas daquele mês. A primeira vez que o termo assédio moral foi utilizado na Justiça brasileira foi em 2002, conforme a advogada Adriana Calvo. Ele foi trazido para o Brasil por autores e estudiosos do tema. Ainda não há no país uma lei geral que defina o que é o assédio moral e em quais situações ele ocorreria. “Existem leis municipais e estaduais recentes que falam do assédio moral na administração pública”, afirma o professor da Univesidade Estácio de Sá, Jorge Luiz de Oliveira da Silva.
De uma forma geral, pelo direito comparado e pelo que já existe na jurisprudência brasileira, o assédio moral é caracterizado pela perseguição psicológica sofrida por um empregado, praticada por um superior hierárquico, podendo causar problemas físicos e emocionais. Adriana Calvo acrescenta que para ficar caracterizado o assédio moral é necessário que o empregado desenvolva algum tipo de trauma. “Um mero problema de relacionamento ou estresse não é assédio moral”, diz. Além disso, os atos que causam o trauma devem ser contínuos e atingir uma pessoa em específico ou um grupo pequeno de pessoas, como afirma Silva. A lista negra, por exemplo, ou a revista íntima dos empregados efetuadas pela empresa não caracterizam o assédio moral, mas o dano moral, conforme Adriana Calvo. O assédio moral seria, portanto, um tipo de dano moral.
O advogado Thiago Proença Cremasco, do Cremasco Advocacia, afirma que a comprovação do assédio moral é difícil. Isso porque, normalmente, o assédio é sutil, velado. “Normalmente são gestos, pequenos atos cometidos”, afirma o advogado, que possui mais de dez ações por assédio moral. Nesse contexto, diz, todo tipo de prova é válido. Podem ser apresentados e-mails, cartas, testemunhas e planilhas de trabalhos que seriam exigidos apenas do empregado assediado, e não dos demais.
Em pedidos como esse, afirma o advogado José Guilherme Mauger, do Pompeu, Longo, Kignel & Cipullo Advogados, quem tem que comprovar o assédio é o empregado. De acordo com ele, o tema tem sido cada vez mais debatido, e não somente no Judiciário. Há inúmeros sites que tratam exclusivamente do assunto e material que aborda a questão. Mauger afirma que as empresas com um departamento de recursos humanos bem-organizado têm cada vez mais se preocupado com a questão. “As empresas tem que orientar as chefias e incentivar a relação saudável entre as pessoas”, afirma Cremasco. Apesar do crescimento do uso do termo, o advogado Marcelo Batuíra Pedroso, do Moraes Pitombo e Pedroso Advogados, afirma que o assédio moral não é uma figura juridicamente válida, pois não está presente em lei. “É uma criação doutrinária”, diz. O advogado afirma que o juiz que vê assédio moral vai basear-se em fundamentos ideológicos, que não vislumbram a realidade do mercado de trabalho. Para ele, se o empregado se submete ao chamado assédio moral, é porque ele quer sobreviver naquela empresa, pois tem a opção de mudar de trabalho.
Fonte: Valor Econômico