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Teoria da Responsabilidade Objetiva em Acidentes de Trabalho

Decisão recente da SDI-1 do TST aplica a teoria da responsabilidade objetiva do empregador em caso de acidente do trabalho, mesmo quando ocorrido antes da entrada em vigor do Novo Código Civil

A análise desse caso revela fundamentos importantes para o candidato utilizar em questões subjetivas e petições em que haja necessidade de responsabilizar a empresa objetivamente por acidente de trabalho

Ednaldo Brito
Professor do CEJUR
Procurador do Trabalho

Após a edição do Código Civil de 2002, ganhou força no TST a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva do empregador quanto aos danos provocados à vida, saúde e integridade física do empregado quando a atividade desenvolvida pela empresa seja potencialmente danosa, ou seja, quando normalmente já apresente risco ao trabalhador. Referido entendimento se baseia no parágrafo único do art. 927 do Código Civil, que impõe a obrigação de reparar o dano, independentemente, de culpa, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Foi esse o principal fundamento utilizado pelo TST no julgamento dos Embargos em Recurso de Revista n° TST-E-RR-367600-35.2006.5.12.0053, em que foi embargante a empresa GAMA MINERAÇÃO S.A.

Nesse caso, o empregado da Gama Mineração S/A alegou que contraiu uma pneumoconiose por lidar com o desmonte e carregamento de carvão mineral extraído nas frentes de trabalho no subsolo da mineradora durante 13 anos, no exercício das funções de gerente de produção e operador de retroescavadeira (como se vê, contraiu uma doença profissional, vez que a patologia está diretamente ligada ao exercício da profissão em si, que, pela sua natureza, já expõe o empregado ao risco de contrair a doença).

O pedido de indenização formulado pelo empregado foi julgado improcedente pelo Juiz da 3ª Vara do Trabalho de Criciúma/SC.

Ao julgar o Recurso Ordinário do empregado, o TRT da 12ª Região reformou a sentença de primeiro grau e deferiu o pedido de indenização por danos morais ao argumento de que “é notório o fato de que o trabalho em minas de carvão traz como resultado a ocorrência de pneumoconiose” aduzindo ainda que “Nesse caso, a responsabilidade da empresa é objetiva (parágrafo único do art. 927 do Código Civil), pois a atividade, por sua própria natureza, representa um risco para as pessoas que nela trabalham”. Aplicou, portanto, a teoria da responsabilidade objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, dispensando o trabalhador de provar o nexo causal entre a atividade desempenhada na empresa e a doença que contraiu.

Inconformada com a decisão, a empresa interpôs Recurso de Revista para o TST alegando, dentre outros fundamentos, violação ao art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal, que consagra a responsabilidade civil “subjetiva” do empregador pelos danos ocasionados ao empregado em virtude de acidente do trabalho. Ou seja, para a empresa recorrente, a responsabilidade objetiva não seria aplicável à hipótese de acidente do trabalho em virtude da disciplina específica da matéria no texto constitucional. Além disso, a empresa sustentava a inaplicabilidade do parágrafo único do art. 927 do Código Civil pelo fato de a doença ter sido adquirida antes da entrada em vigor do novo Código (o empregado havia sido demitido em 1994).

A tese, porém, foi rejeitada pela 7ª Turma do TST, que sequer conheceu da Revista por entender inexistir afronta ao texto constitucional.

Diante do posicionamento turmário, a empresa interpôs embargos à SDI-1, que foram conhecidos por divergência jurisprudencial, uma vez que a 3ª Turma do TST havia decidido, em julgamento proferido em 2010, que a teoria da responsabilidade objetiva, calcada no art. 927 do Código Civil, não poderia ser aplicada a um acidente de trabalho ocorrido antes da vigência desse código (neste caso o acidente tinha acontecido antes de 2000 e o novo Código Civil entrou em vigor em 2002).

Observação: O recurso de Embargos para a SDI está previsto no art. 894, II, da CLT, mostrando-se cabível quando o recorrente demonstrar que a decisão proferida por uma Turma do TST diverge da decisão proferida por outra turma ou pela própria SDI. Só não é cabível se, apesar da divergência, a decisão recorrida estiver em consonância com Súmula ou Orientação Jurisprudencial do TST ou do STF.

O art. 3º, III, “b”, da Lei 7.701/88, prevê a competência da Seção de Dissídios Individuais do TST (SDI) para julgar esses Embargos em última instância.

Portanto, a SDI tem uma função uniformizadora da jurisprudência do TST, motivo pelo qual suas decisões se revestem de grande relevância para o conhecimento da posição definitiva deste Tribunal acerca das matérias que lhe são submetidas a julgamento.

Ao analisar o mérito da questão, a SDI-1 não deu provimento aos Embargos da empresa, mantendo a condenação e a tese sustentada pelo TRT Catarinense.

De acordo com a SDI-1, a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva aos casos de acidente de trabalho (incluindo as doenças do trabalho e as doenças profissionais por força do art. 20 da Lei 8.213/91), quando a atividade empresarial se encaixa nos moldes previstos no parágrafo único do art. 927 do Código Civil (atividade normalmente arriscada), não ofende o disposto no inciso XXVIII do art. 7º da Constituição Federal de 88, sendo possível a convivência dos dois institutos (responsabilidade subjetiva e objetiva). Entendeu a SDI, também, que não seria ilegítima a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva aos acidentes do trabalho ocorridos antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002.

Em resumo, é possível extrair do acórdão da SDI os seguintes fundamentos para justificar a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva no caso de acidente de trabalho quando a atividade da empresa normalmente implicar em risco para a segurança do empregado, ainda que o acidente tenha acontecido antes da vigência do Código Civil de 2002:

FUNDAMENTOS UTILIZADOS PELO TST PARA APLICAÇÃO DA TEORIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA SEM QUE ISSO REPRESENTE OFENSA AO ART. 7º, XXVIII, DA CF/88:

• O “caput” do art. 7.º da Constituição Federal constitui-se tipo aberto, vocacionado a albergar todo e qualquer direito quando materialmente voltado à melhoria da condição social do trabalhador;
• A responsabilidade subjetiva do empregador, prevista no inciso XXVIII do art. 7º, constitui direito mínimo assegurado ao obreiro. Trata-se de regra geral que não pode excluir ou inviabilizar outras formas de alcançar o direito à indenização por acidente de trabalho;
• Referido artigo está inserido no rol das garantias mínimas do trabalhador (7º, caput), de modo que a edição de legislação infraconstitucional consagrando uma maior responsabilidade do empregador nas hipóteses acidentárias, em casos específicos (atividades que exponham o trabalhador a risco), não encontra na Constituição Federal nenhum impedimento, até mesmo se se considerarem os princípios do direito do trabalho, como o da proteção, o da norma mais favorável, o da condição mais benéfica, entre outros. Obstáculo haveria se a norma infraconstitucional trouxesse diretriz contrária aos valores que a Carta Magna buscou resguardar;
• Cumpre destacar a “teoria do risco criado”. Por essa teoria, entende-se como “cláusula inata” ao contrato de trabalho a incolumidade do trabalhador e a garantia de um salutar meio ambiente do trabalho. Por isso, se o empresário, devido à sua atividade, expõe o trabalhador a perigo iminente, vindo este a se acidentar, por certo que responde objetivamente, pois o infortúnio ocorreu devido à situação de risco por ele criada, bem como porque houve o inadimplemento da mencionada cláusula contratual. Não se pode olvidar, também, que essa exposição resultou no recebimento de lucros pelo empregador.

FUNDAMENTOS UTILIZADOS PARA APLICAÇÃO DA TEORIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA AOS ACIDENTES DE TRABALHO OCORRIDOS ANTES DA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002:

• A teoria do risco da atividade empresarial sempre esteve contemplada no artigo 2° da CLT, sendo que a responsabilidade mencionada no referido dispositivo (ao afirmar que o empregador é aquele que assume “os riscos da atividade econômica”) não deve se referir apenas ao risco “econômico” da atividade empresarial, estando relacionada também aos riscos que possam afetar a saúde, a vida e a integridade física do empregado;
• Tal risco também já era reconhecido ante a redação do artigo 157 da CLT, que sempre impôs às empresas a obrigação de cumprirem e fazerem cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho e a instruir os empregados quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes ou doenças ocupacionais;
• No mesmo sentido o disposto no artigo 162 e seguintes da CLT, que também há muito já impunha ao empregador a constituição de serviços especializados em segurança e medicina do trabalho, com vistas a garantir a saúde e a melhor condição de trabalho aos empregados, evitando acidentes.

ATENÇÃO!

Esse posicionamento da Seção de Dissídios Individuais do TST é de extrema relevância para os estudantes e profissionais do direito, pois reflete o entendimento que se pacificará na mais alta Corte trabalhista.

Ou seja, em se tratando de atividade de risco, a responsabilidade do empregador por acidente de trabalho (aí incluídas as doenças ocupacionais – doença profissional e doença do trabalho) é objetiva em razão da aplicação do parágrafo único do art. 927 do Código Civil. Tal responsabilidade é aplicável mesmo tendo o acidente ocorrido em data anterior à vigência do Código Civil de 2002. Nesses casos, o empregado precisará provar apenas a atividade exercida e o acidente de trabalho sofrido, sendo desnecessária a prova do nexo de causalidade entre um e outro para a obtenção da indenização.

Fonte: TST

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