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Na Imprensa

O diretor executivo e o direito trabalhista

Nas últimas décadas, as formas de recrutamento dos dirigentes das sociedades comerciais passaram por diversas fases: o dirigente-fundador, o dirigente-sucessor e o dirigente profissional. Os dois primeiros tipos de dirigentes são típicos administradores patrimoniais de empresas constituídas sobre a forma de sociedade de pessoas. Já o administrador profissional surgiu com a sociedade anônima, que trouxe um novo modelo de sociedade (sociedade de capitais) e de administração (propriedade desvinculada da administração).

A princípio, esse novo tipo de dirigente não-proprietário passou a ser recrutado externamente à companhia. A doutrina trabalhista e comercialista dividiu-se em duas vertentes: a clássica (teoria do mandato ou teoria organicista), que defende a inexistência de vínculo de emprego; e a teoria moderna, que sustenta que não há qualquer impedimento de celebração de contrato de trabalho entre o diretor estatutário e a sociedade anônima.

Com o crescimento das companhias e o aumento da sua complexidade administrativa, passou a ser recorrente o recrutamento de empregados internamente à sociedade para exercer a função de administrador profissional. Quanto à natureza jurídica do vínculo do diretor estatutário com a sociedade anônima, a evolução da doutrina trabalhista foi curiosa.

Segundo classificação proposta por Maurício Godinho Delgado, a primeira corrente doutrinária sustentava que as duas posições de diretor e empregado eram incompatíveis, considerando a extinção do contrato de trabalho. Em seguida, a doutrina passou a entender que enquanto o empregado estivesse exercendo o cargo de diretor estatutário, havia suspensão do contrato de trabalho. Logo após, como era difícil explicar a suspensão para assegurar certos direitos a esse empregado, admitiu-se que não se tratava de suspensão, mas, sim, de interrupção. Por último, a doutrina trabalhista defendeu que a elevação do empregado ao cargo de diretor estatutário não altera o seu status de empregado, sendo possível a manutenção do contrato de trabalho.

A teoria da suspensão do contrato de trabalho foi vencedora em 1988, sendo editado o Enunciado nº 269 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que possui uma única ressalva para a manutenção do vínculo de emprego: a existência de subordinação jurídica inerente à relação de emprego.

Na atualidade, discute-se a necessidade da reconstrução dogmática do direito do trabalho, principalmente no tocante à evidente do seu critério definidor: a subordinação jurídica. Neste novo contexto, é imperiosa a revisão da Súmula nº 269 do TST e a busca de novas alternativas de tutela para o diretor por meio de um diálogo entre o direito comercial e o direito trabalhista.

O surgimento da S.A. e do diretor estatutário são reflexos da evolução de ambos os ramos do direito

Luiz Carlos Amorim Robortella é um dos autores atuais que defende a revisão da Súmula nº 269 do TST: “As efetivas diferenças entre trabalhadores devem ser levadas em conta pelo sistema jurídico e pelo magistrado. Só assim se recuperará a essência dogmática do direito do trabalho, que é a tutela dos desprotegidos em face do poder da empresa capitalista”.

As relações de trabalho mudaram e novos paradigmas sugiram no mercado de trabalho mundial, sendo impossível conceber novas relações de trabalho, inclusive o regime jurídico do direito estatutário somente sob a ótica dos conceitos genéricos e abstratos de empregador e empregado, previstos nos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Atualmente, há duas correntes na doutrina trabalhista que buscam explicar a natureza jurídica do vínculo do diretor estatutário com a sociedade anônima, negando a existência de vínculo de emprego: a primeira explica que a relação existente é meramente societária, amparada pela legislação das sociedades anônimas, e a segunda sustenta que o diretor seria um trabalhador parassubordinado, devendo ser amparado por um estatuto mínimo de direitos, principalmente quanto aos direitos oriundos na destituição do seu mandato.

Robortella defende a existência de uma relação exclusivamente societária amparada pela legislação das sociedades anônimas: “Diretores da sociedade, sujeitos apenas ao conselho de administração, com os mais amplos poderes de gestão, não podem ser confundidos com o trabalhador subordinado. É necessário oferecer segurança jurídica e imprimir coerência ao sistema, mediante harmonização das normas tutelares trabalhistas com o novo direito de empresa do Código Civil de 2002”.

Otávio Pinto e Silva aponta expressamente que na doutrina italiana já existe a tendência de se entender que o diretor estatutário poderia ser tratado como um trabalhador parassubordinado: “Também é possível a parassubordinação na relação jurídica que une a sociedade e o administrador por ela contratado, desde que a situação de fato se enquadre nos requisitos legais, não resvalando para um vínculo de emprego”.

Orlando Gomes traz uma importante contribuição sobre o tema ao defender que a criação de uma nova figura de natureza híbrida denominada pelo autor de “patrão-empregado”: a substituição do patrão-proprietário pelo patrão-empregado ou patrão-anônimo, conhecida na atualidade como o fenômeno da despersonalização do empregador, processou-se através da institucionalização das empresas mais importantes em sociedades por ações.

O surgimento da sociedade anônima e do diretor estatutário são reflexos da evolução de ambos os ramos do direito e da necessidade de uma nova visão interdisciplinar: o direito do trabalho empresarial.

Fonte: Valor Econômico

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