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Justiça rejeita multa milionária a metroviários por greve

Para magistrado, caso deve ser analisado pela Justiça do Trabalho; entidade considera ‘absurda’ ação do Ministério Público Estadual

A Justiça rejeitou o pedido de multa de R$ 354,4 milhões feito pelo Ministério Público Estadual (MPE) endereçado ao Sindicato dos Metroviários de São Paulo na semana passada, em decorrência da greve da categoria em junho. A ação da Promotoria já havia sido criticada pela entidade e por especialista em Direito Administrativo ouvido pelo Estado.

No entendimento do juiz Carlos Aleksander Romano Batistic Goldman, da 12.ª Vara Cível do Fórum Central, a Justiça comum não tem competência para julgar o caso, que envolve questões do direito de greve. “Ocupando-se a demanda de pretensos agravos coletivos derivados diretamente do dito desrespeito aos limites do direito de greve”, escreve o magistrado em sua decisão, “reconheço a incompetência absoluta deste Juízo e da Justiça Estadual Comum para presidir o feito e comando sua urgente remessa, via Cartório Distribuidor, a uma das Varas da Justiça do Trabalho de São Paulo”.

O caso já vinha sendo analisado na Justiça do Trabalho desde a deflagração da greve, em 5 de junho. O próprio sindicato já havia sido multado em R$ 900 mil pela paralisação pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2.ª Região.

A tentativa do MPE de cobrar na Justiça o pagamento de R$ 354,4 milhões foi ajuizada em forma de ação civil pública na semana passada. Além do Sindicato dos Metroviários, a Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo também pediu R$ 131,7 milhões do Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores Rodoviários Urbanos de São Paulo (Sindmotoristas) em virtude de uma greve de parte da categoria em maio. Nesse caso, a decisão ainda não havia sido proferida pela Justiça. As duas entidades disseram que recorreriam, assim que citadas, mas já classificaram a cobrança de absurda. Para o promotor, os dois sindicatos descumpriram parte das leis trabalhistas ao não manter pelo menos uma parcela dos trabalhadores ativos durante as paralisações.

Os dois valores pedidos pela Promotoria são muito mais elevados do que os fixados pelo TRT à época do julgamento das duas greves. Segundo o promotor Mauricio Ribeiro Lopes, responsável pelas ações, os patamares correspondem a um trigésimo de salário mínimo para cada uma das pessoas que teriam ficado impossibilitadas de andar de ônibus e metrô durante as duas paralisações.

Nos cálculos do Metrô, que é controlado pelo governo do Estado, um total de 7.177.932 passageiros não puderam circular por suas quatro linhas (há uma outra, a 4-Amarela, que é gerida pela iniciativa privada e que não foi atingida pela greve). Ribeiro Lopes argumentou na ação que, além dessa perda, “nos dias de greve houve interrupção de rodízio de autos na capital, acarretando além dos congestionamentos de centenas de quilômetros pela cidade, considerável desgaste emocional à população, aumento do nível de stress” e piora da qualidade do ar atmosférico, dobrando a multa.

Com isso, a multa indenizatória calculada por Ribeiro Lopes no caso dos metroviários chega a R$ 354.406.998,32. O promotor alega que o ressarcimento será pelo fato de a população ter tido “danos materiais e morais decorrentes da abusiva paralisação que trouxe o caos ao sistema de mobilidade urbana”.

Por sua vez, o MPE informou que a São Paulo Transporte (SPTrans), da Prefeitura, calculou que 2.729.900 pessoas ficaram sem os ônibus municipais entre os dias 20 e 23 de maio (no dia 12, algumas linhas da zona sul também foram afetadas), enquanto a greve esteve ativa. Pela lógica da Promotoria, o Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores Rodoviários Urbanos de São Paulo (Sindmotoristas) terá que desembolsar R$ 131.744.974,00. Ribeiro Lopes ainda levou em conta, como no caso do Metrô, os transtornos para os motoristas de carro e o aumento da emissão de gases poluentes.

A Promotoria também queria o bloqueio de todos os bens dos dois sindicatos. O dinheiro arrecadado com a aplicação das multas iria para o Fundo Especial de Despesa de Reparação de Interesses Difusos Lesados (Fid), mantido pela Secretaria Estadual da Justiça. Segundo Ribeiro Lopes, o valor não necessariamente se destinaria a intervenções relacionadas à mobilidade urbana.

“Pode parecer, mas não é muito. Se inviabiliza o sindicato, não é problema meu. O sindicato está inviabilizando a cidade”, disse Ribeiro Lopes na semana passada.

Críticas. O presidente do Sindmotoristas, José Valdevan de Jesus Santos, o Noventa, e o secretário-geral do Sindicato dos Metroviários, Alex Fernandes, classificaram de “absurdo” os valores cobrados das entidades.

“É uma tentativa de intimidação do movimento sindical, mas vamos tomar as devidas providências e fazer a defesa e denunciar essa postura do Ministério Público para o País todo”, disse Fernandes. “Não houve um direcionamento (de greve) por parte da direção do sindicato”, afirmou Noventa, lembrando que a greve dos motoristas foi descentralizada, não comandada pelos dirigentes da entidade. As duas entidades informaram não ter condições de pagar os valores cobrados pelo MPE.

O Sindmotoristas já aceitou pagar R$ 100 mil pela paralisação, em um acordo que envolveu o Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss), entidade patronal que desembolsou o mesmo valor, nas negociações na Justiça do Trabalho. Já o Sindicato dos Metroviários foi condenado a pagar R$ 900 mil pelo TRT, mas está recorrendo no Tribunal Superior Eleitoral (TST).

Em entrevista ao Estado na semana passada, o presidente da Comissão de Direito Administrativo da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), Adib Kassouf Sad, disse que o MPE não pode virar as costas para os sindicatos, desconsiderando a sua continuidade. “Eles são essenciais na representação das categorias. É a Justiça trabalhista que deve apurar eventuais erros ou abusos dessas entidades. Esses pedidos, de R$ 131 milhões e R$ 354 milhões, em princípio, são valores que estão sendo encontrados sem um critério objetivo fixado por lei, o que se mostra absolutamente inadequado.”

Além disso, Sad entende que abusos no direito de greve “têm que ser resolvido na esfera trabalhista”, o que já está ocorrendo. O advogado sustenta ainda que o Fid não ressarcirá, necessariamente, as pessoas afetadas pelas duas paralisações. “Esse fundo não é para indenizar as pessoas. É um pouco complicado.”

Fonte: Estadão

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