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Covid rende quase 5.000 denúncias contra empresas durante pandemia

Publicado originalmente em noticias.r7.com

Hospitais, serviço público e call centers concentram indícios de irregularidades nos cuidados para preservar saúde do trabalhador.

Desde o início da pandemia da covid-19, o MPT-SP (Ministério Público do Trabalho de São Paulo) registrou 4.961 denúncias de irregularidades dentro das empresas para preservar a saúde do trabalhador.

O número é 122% maior do que o apurado em julho do ano passado, quando o órgão contabilizou 2.239 queixas no estado.

No período, também foram ajuizadas 60 ações civis públicas, abertos 1.150 inquéritos civis e emitidos 40 TACs (Termos de Ajustamento de Conduta).

As principais denúncias são relacionadas a irregularidades em relação às medidas sanitárias. Entre elas, estão:

• o não afastamento de pessoas vulneráveis ou de risco;
• o não cumprimento de distanciamento dos postos de trabalho;
• falta de máscaras e álcool em gel e outras providências que são preconizadas durante a pandemia; e
• o não afastamento de pessoas com suspeita de covid.

Aumento de ações judiciais sobre covid-19

Guilherme Feliciano, juiz do trabalho da Sexta Câmara do TRT-15 (Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região), que abrange a região de Campinas (SP), faz uma análise desse pouco mais de um ano de pandemia da covid-19.

“Agora temos um quadro mais claro da situação e estamos percebendo um aumento significativo na demanda de ações com o tema covid,” diz.

O magistrado relata que houve uma alta de 115% nos processos no TST (Tribunal Superior do Trabalho) que tratam sobre a covid no primeiro trimestre de 2021 na comparação com os três primeiros meses do ano passado. No período, foram distribuídos 2.397 novos casos envolvendo coronavírus nas varas de Trabalho.

No TRT-15, Feliciano diz que os processos em outras áreas caíram enquanto os que envolvem o tema covid continuam em alta.

Em 2020 chegaram 1.243 casos ligados à covid para análise do tribunal. Desses, até abril deste ano, 844 já estavam solucionados. No primeiro semestre de 2021, já foram analisados 141 processos ligados à covid.

No TRT-2, que abrange a cidade de São Paulo e região metropolitana, de novembro de 2020 a março deste ano, foram registrados 934 processos relacionados à covid. As ações englobam, entre outros assuntos, movimentação de FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e indenização.

“Uma pandemia leva à retração da economia e, se a atividade econômica não cresce, não tem aumento de demanda na Justiça do Trabalho”, conta.

Covid-19 é doença ocupacional ou acidente de trabalho?

Feliciano pontua que uma das principais discussões é se a covid-19 é uma doença ocupacional ou acidente de trabalho. O magistrado, por sua vez, já tem um entendimento.

“Se houver casos confirmados ou até mesmo suspeitos de covid no ambiente de trabalho, há a presunção de que o trabalhador adquiriu a doença na empresa e cabe a ela provar o contrário. E isso é caracterizado como doença ocupacional.”

GUILHERME FELICIANO

Feliciano tem um respaldo de peso. Uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) abriu caminho para profissionais que mantiveram sua atividade de trabalho dentro da empresa possam caracterizar a contaminação pelo novo coronavírus como doença ocupacional e, assim, garantir um benefício do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) mais atrativo.

O que está em jogo?

Ao classificar a covid-19 como uma doença ocupacional, o trabalhador tem direito ao benefício integral, a partir do primeiro dia de contratação, e estabilidade de 12 meses no emprego.

“Quando há a classificação de acidente de trabalho, o empregado usufrui do direito automático à cobertura do INSS mesmo que tenha acabado de começar a contribuir com o sistema. O mesmo não ocorre para o auxílio-doença”, diz o magistrado.

Feliciano frisa que os principais tribunais – TRT-1, TRT-2, TRT-3, TRT-15 – têm entendimentos com decisões já proferidas de que a contaminação por coronavírus no ambiente de trabalho é caracterizada como doença ocupacional.

Volta ao trabalho exige cuidados

A advogada Adriana Calvo, professora da FGV Direito RJ e coordenadora de direito individual da OAB/SP, diz que percebeu um aumento de denúncias por falta de instrumentos de trabalho essenciais, tais como:

• álcool em gel; e
• máscara.

Adriana afirma que o funcionário não pode se recusar a voltar ao trabalho se a empresa determinar. Mas dá duas orientações:

“Ele pode apresentar um laudo médico para provar que não tem condições de voltar ou solicitar a rescisão indireta do contrato do trabalho. Nessa modalidade, é o empregado que ‘demite’ a empresa e tem todos os direitos trabalhistas garantidos.”

São eles:

• salário proporcional aos dias trabalhados desde o último pagamento);
• aviso-prévio;
• férias vencidas e proporcionais, acrescidas de 1/3;
• 13° salário proporcional;
• saque dos FGTS com o acréscimo de 40% do total referente à indenização; e
• seguro-desemprego.

A advogada explica ainda que esse tipo de ação pode ser solicitada quando a empresa deixa de cumprir o contrato ou cria condições de trabalho intoleráveis.

Daí o funcionário pode interromper o contrato e receber todos os seus direitos sem nenhum ônus.

Grávidas não são obrigadas a voltar

A Lei nº14.151/2021 garantiu para a gestante que não pode realizar sua atividade de forma remota o afastamento do trabalho remunerado.

A legislação vem abrindo outro tipo de discussão: se as grávidas podem se afastar e continuar recebendo por causa do risco de voltar ao trabalho presencial, por que não pode ser aplicada a mesma medida para quem tem algum tipo de comorbidade?

“Uma empresa já conseguiu parecer favorável na Justiça de que quem deve pagar por esse tempo de afastamento remunerado de uma gestante é o INSS, não a companhia. A matéria deve render muita discussão ainda no meio jurídico.”

ADRIANA CALVO

Para Sebastião Oliveira, desembargador do TRT-MG, a pandemia da covid-19 vai repercutir por muitos e muitos anos no Judiciário.

“Os danos ainda estão se concretizando, seja por morte, sequelas temporárias ou permanentes. Com o passar do tempo devem crescer os pedidos indenizatórios por vítimas da covid-19 ou por familiares de profissionais que morreram.”

SEBASTIÃO OLIVEIRA

Oliveira diz que outros tipos de ações devem surgir e comenta uma que julgou recentemente: a dispensa discriminatória.

Chegou em suas mãos o processo de um trabalhador que foi demitido quando retornou à empresa após se recuperar da covid-19. Para ele, é um caso claro de danos morais.

O desembargador cita a Súmula nº 443 do TST que fala: “presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego”.

O magistrado também lembra que, até agora, não julgou nenhuma ação envolvendo o home office. “Elas devem começar a aparecer em breve.”

 

 

 

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