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Assédio Moral: O Desprestígio Do Legislador Reformista Brasileiro a Um Dos Direitos Sociais Modernos De Maior Importância Do Século XXI

I) INTRODUÇÃO

Pretende-se criticar por meio deste breve artigo o silêncio eloquente do legislador reformista quanto à saude mental dos trabalhadores, muito embora pacificado na doutrina e jurisprudência trabalhista pós-moderna o reconhecimento deste importante direito como um direito fundamental social.

A pergunta central deste artigo é a seguinte: “A saúde mental é um dos direitos fundamentais pós-modernos mais importantes do século XXI. Qual foi a importância dada pelo legislador brasileiro reformista a este importante direito fundamental social de 2ª dimensão?”

A resposta é a esta pergunta é simples, pois o legislador reformista não tratou especificamente do tema assédio moral na Lei 13.467/2017. Houve somente preocupação com o instituto do dano moral intitulado pela Reforma Trabalhista de “dano extrapatrimonial”.

Diante deste cenário de total desprestígio pelo legislador reformista, evidente lacuna normativa, como continuar a combater o assédio moral, seja sob a modalidade de assédio interpessoal ou institucional?

O caminho está, sem dúvida, na defesa intransigente da teoria dos direitos fundamentais, numa visão pós-positivista do Direito no Brasil.

 

II) O DESPRESTÍGIO DO LEGISLADOR REFORMISTA BRASILEIRO À SAÚDE MENTAL DOS TRABALHADORES

O relator da Reforma Trabalhista na Câmara, o deputado Rogério Marinho, do PSDB, afirmou que um dos objetivos da reforma foi modernizar as relações de trabalho no Brasil, tendo publicado inclusive um livro específico sobre o assunto intitulado “Modernização das leis trabalhistas: o Brasil pronto para o futuro” (Da Editora Petrus, 2018).

O instituto do assédio moral nunca foi tratado na CLT, até porque a origem da legislação celetista remonta o ano de 1943 e toda normatividade jurídica desta época gravitava em torno dos conflitos trabalhistas oriundos da 1ª e 2ª Revolução Industrial e do modelo de gestão taylorista fordista.

Durante o século XIX até a Primeira Guerra Mundial, a medicina laboral voltou-se à proteção da saúde física dos trabalhadores e o foco principal era a prevenção dos acidentes de trabalho, principalmente aqueles que causavam sequelas aos trabalhadores e muitas vezes levando-os até a morte.

Com a reestruturação produtiva toyotista implementada no Ocidente na década de 1970, conhecida por esta razão de pós-toyotista, surgiram novas doenças ocupacionais, sendo que a maioria delas ligadas ao stress profissional e do seu agravamento, ou de seu estado mais agudo, conhecido como síndrome de burnout.

A Medicina do Trabalho somente percebeu da importância do ambiente relacional do trabalho e dos efeitos que propicia na saúde mental dos trabalhadores a partir do último terço do século XX.

Apenas após o início da Primeira Guerra Mundial, a Medicina do Trabalho passou a se preocupar com a saúde mental dos trabalhadores.

Em 1946, a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu em sua carta de fundação que saúde é: “um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não somente a ausência de afecções ou enfermidades”, sendo que “o gozo do grau máximo de saúde que se possa alcançar é um dos direitos fundamentais de todo ser humano, sem distinção de raça, religião, ideologia política ou condição econômica ou social”; ademais, “a saúde de todos os povos é uma condição fundamental para se alcançar a paz e a segurança, e depende da mais ampla cooperação das pessoas e dos Estados”, e “os governos têm responsabilidade pela saúde de seus povos, a qual só pode ser cumprida mediante a adoção de medidas sanitárias e sociais adequadas[1].

Posteriormente, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, assegurou a saúde como um direito humano (art. XXV, n. 1).

A partir de 1988, o Direito Constitucional brasileiro passou a reconhecer o direito à saúde como gênero do qual o direito à saúde do trabalhador passou a ser, sem dúvida, sua espécie.

Na Carta Magna, o art. 225 da Constituição Federal passou a prever expressamente que o Estado deve proporcionar às pessoas uma sadia qualidade de vida.

Logo, se o meio ambiente do trabalho integra o meio ambiente geral (art. 200, inciso VIII, da CF), também na empresa deve o trabalhador encontrar condições que lhe assegurem uma boa qualidade de trabalho e, em consequência, de vida.

Portanto, não há dúvidas que a saúde mental é um dos direitos sociais modernos de maior importância do século XXI e o legislador reformista não poderia ter ignorado este direito se o objetivo era realmente modernizar as relações de trabalho no Brasil.

 

III) A IMPORTÂNCIA DA TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS PARA O COMBATE DO ASSÉDIO MORAL NO BRASIL

Diante da lacuna legislativa sobre o conceito de assédio moral no Brasil, o papel da doutrina e jurisprudência trabalhista brasileira e estrangeira foi de suma importância jurídica para definição e delimitação do seu conceito jurídico.

O primeiro julgado no Brasil sobre assédio foi proferido no ano de 2002[2] e uma das primeiras juristas brasileiras a estudar o assunto foi a juíza do trabalho   Márcia Novaes Guedes em sua obra conhecida como “Terror Psicológico no Trabalho[3] publicada em 2004.

Guedes trouxe o seguinte conceito de assédio moral individual:

“Mobbing significa todos aqueles atos comissivos ou omissivos, atitudes, gestos e comportamentos do patrão, da direção da empresa, de gerente, chefe, superior hierárquico ou dos colegas, que traduzem uma atitude de contínua e ostensiva perseguição que possa acarretar danos relevantes às condições físicas, psíquicas, morais e existenciais da vítima”.[4]

Hirigoyen definiu o conceito de assédio moral individual como:

“Toda e qualquer conduta abusiva, manifestando-se sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, por em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho”.[5]

O estudo do assédio moral interpessoal é vasto na doutrina e na jurisprudência brasileira, por isso não será nosso foco de atenção neste artigo.

Passaremos a estudar o assédio moral institucional, tema pouco ainda aprofundado na doutrina e ainda incipiente na jurisprudência.

O termo assédio moral institucional é utilizado como sinônimo de “assédio moral coletivo, assédio moral organizacional, gestão por stress ou straining”.

O primeiro caso de assédio moral institucional reconhecido no Brasil foi da Ambev (Companhia Brasileira de Bebidas S.A.), no qual o Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Norte teve reconhecido o seu pedido de danos morais coletivos perante o Tribunal da 17ª Região em 23/08/2006.

Em 2003, Einarsen et al.[6] publicaram uma obra sobre a visão europeia do assédio moral e apresentaram uma importante distinção entre o conceito de bullying interpessoal e bullying institucional (termos utilizados pelos autores: work related bullying versus person related bullying).

Gosdal e Soboll, explicam que a expressão assédio moral interpessoal foi utilizada por tais autores somente para diferenciar do assédio moral institucional (chamado pelos autores de organizacional), vejamos:

 o assédio moral interpessoal normalmente tem como alvo pessoas, ou pequenos grupos de indivíduos específicos. Já o assédio moral organizacional, orienta-se a alvos que não são específicos, mas são determináveis, podendo alcançar grande parte dos trabalhadores da empresa”.[7]

 

Einarsen, Hoel, Zapf e Cooper chegam a afirmar que “no assédio moral institucional não é dirigida nenhuma tarefa para um indivíduo específico, por isso se trata de uma forma despersonalizada de assédio[8] (grifo nosso).

Nessa linha de pensamento, Gosdal e Soboll ressaltam que no assédio moral institucional as interações são indiretas: “há situações em que os administradores, individual ou coletivamente, executam estruturas e procedimentos organizacionais que podem atormentar, abusar ou até mesmo explorar os empregados. Portanto, bullying, nesses casos, não se refere estritamente a interações interpessoais, mas antes a interações indiretas entre o indivíduo e a administração da empresa”.[9]

Logo, o assédio moral pode ser estudado de forma subjetivista (assédio moral interpessoal) ou objetivista (assédio moral institucional). No assédio moral interpessoal há sempre envolvidas pelo menos duas partes, ou seja, o agressor (assediador) e a vítima (assediado). Os assediadores podem ser múltiplos (por exemplo: equipe contra o chefe) ou os assediados podem ser múltiplos (por exemplo: o chefe contra a equipe toda).  Esse último tipo de assédio de grupos é conhecido nos EUA como gang bullying.

Qual seria a primeira diferença entre o assédio moral interpessoal e o institucional?

Em primeiro lugar, pode-se apontar como critério diferenciador o autor do ato de assédio moral. No assédio moral interpessoal, como o próprio nome já explica, o agressor é uma pessoa natural – indivíduo ou grupo.

No assédio moral institucional, o agressor é a própria pessoa jurídica que, por meio de seus administradores, utiliza-se de uma política de gestão desumana para aumentar os seus lucros criando uma verdadeira cultura institucional de humilhação.

Araújo foi pioneira na seara jurídico trabalhista a trazer uma definição de assédio moral institucional, nomeado pela autora como organizacional[10]. O conceito proposto por Araújo é inovador no sentindo de ser baseado na obra de Focault e defender que o assédio moral é uma sanção normalizadora da sociedade disciplinar empresarial:

 

“O conjunto de condutas abusivas, de qualquer natureza, exercício de forma sistemática durante certo tempo, em decorrência de uma relação de trabalho, e que resulte no vexame, humilhação ou constrangimento de uma ou mais vítimas com a finalidade de se obter o engajamento subjetivo de todo o grupo às políticas e metas da administração, por meio da ofensa e seus direitos fundamentais, podendo resultar em danos morais, físicos e psíquicos”.

 

Gosdal e Soboll entendem que o conceito pioneiro acima proposto por Araújo é amplo e não deveria ser adotado para configurar o assédio moral institucional:

“É importante o conceito trazido pela autora, que intitula sua dissertação de mestrado de “assédio moral organizacional” e destaca sua dimensão coletiva de modo conceitual pela primeira vez em pesquisas brasileiras. Contudo, entendemos muito amplo o conceito proposto. Para a autora todo assédio que não for meramente interpessoal, é organizacional, o que inclui situações que não há uma política deliberada da empresa que configura assédio, mas a empresa permite o assédio, porque escolhe chefias e líderes assediadores. De acordo com o conceito da autora, todo assédio que não seja fundado em questões totalmente alheias a empresa, é organizacional. O que inclui no conceito situações em que não há uma política deliberada da empresa ou do gestor configuradora do assédio”.[11]

 

Renato de Almeida Oliveira Muçouçah defende que o assédio moral individual denominado por ele de assédio moral simples é na verdade modalidade de assédio moral individual homogêneo.

O fundamento do autor está na Lei nº 8.078/1990, em seu art. 81, III, que concebe direitos individuais homogêneos como aqueles que se apresentam uniformizados pela origem comum.

Nesse sentido, concorda-se com as psicólogas Gosdal e Soboll: “em geral, os autores identificam uma dimensão coletiva para o assédio moral, mas não chegam a conclusão que a empresa pode ser mais que simplesmente tóxica, ou simplesmente permissiva com relação ao assédio, para ser promotora de tais práticas[12]. (grifo nosso).

Zabala, psicólogo e administrador de RH, afirma que o assédio moral não é somente um problema do indivíduo, mas um problema da organização do trabalho (a toxidade organizacional). Nesse sentido, essas empresas são consideradas tóxicas, uma vez que trabalhar nelas prejudica a saúde dos trabalhadores[13].

Hirigoyen reconhece que a empresa pode ser autora de práticas assediantes com objetivos maquiavélicos: “quando o fim justifica os meios e ela se presta a tudo, inclusive a destruir os indivíduos, se assim vier a atingir seus objetivos[14].

Os psiquiatras e os psicólogos têm reconhecido a existência da síndrome do assédio moral institucional gerada por algumas empresas pós-toyotistas do século XXI, consideradas tóxicas, que impõem políticas institucionais neoliberais que atentam contra a saúde dos trabalhadores, principalmente a saúde mental.

No campo da psiquiatria estrangeira, o psiquiatra espanhol Revuelta defende a ocorrência de uma síndrome do assédio moral institucional.

Nessa linha de pensamento, no direito comparado português, R. Pereira defende também que o mobbing institucional é:

“…..parte de uma estratégia de gestão de recursos humanos, na esteira das novas formas de organização do trabalho – medidas aplicáveis a todo ou parte do universo de trabalhadores, com vista à implementação de determinados procedimentos ou à proibição de certos comportamentos, visando-se atingir como tal melhores resultados produtivos”.[15]

 

Eberle enfatiza o papel do discurso organizacional no assédio moral institucional:

“Os abusos são, geralmente, nos casos de assédio moral organizacional, envoltos de um discurso organizacional capaz de justificar tais práticas como necessárias e úteis, em nome dos valores relevantes na empresa e da sobrevivência organizacional, com tendência à naturalização da violência”.[16]

Do ponto de vista jurídico, não há como deixar de reconhecer a existência do assédio moral institucional como espécie distinta do assédio moral interpessoal, como a face despersonalizada do assédio.

Dessa forma, em nossa tese de doutorado defendida na PUC/SP em 2013, convertida em publicação de obra pela editora Ltr[17], defendemos os seguintes requisitos para configuração de assédio moral institucional a seguir:

1. ofensa ao direito fundamental à saúde no ambiente de trabalho – não é necessária a prova do dano psíquico coletivo, mas este pode ser facilmente identificado por psicólogos e psiquiatras como síndrome loco-neurótica (SLN) ou síndrome do assédio moral institucional:

2. atos inseridos dentro da política institucional da empresa – os atos de ofensa à dignidade humana dos trabalhadores são inseridos na política institucional da empresa por meio de diversos modelos de gestão: administração por estresse, administração por injúria, bossingstraining, dentro outros.

3. presença do caráter despersonalizado do assédio – os atos não serão dirigidos a pessoas ou grupo específicos, mas sim à coletividade dos trabalhadores de um setor da empresa ou de toda a empresa. Portanto, não há presença de alvos específicos, embora determináveis e;

4. o agressor é a empresa – o agressor é a própria pessoa jurídica (acionistas) que por meio de seus administradores (conselheiros e diretores) se utiliza de uma política de gestão desumana para atingir objetivos, em geral de fins econômicos, não sendo necessária a prova da intenção dolosa na prática do ato, uma vez que faz parte de uma estratégia de administração da empresa.

 

É nesse sentido que entendemos que se deve refletir sobre o assédio moral institucional, como uma forma despersonalizada de assédio, que ocorre por meio de práticas desumanas institucionalizadas de administração empresarial com o objetivo de maximizar os lucros.

A Lei 13467/2017 (Reforma Trabalhista) não comtemplou nenhum artigo sobre o instituto do assédio moral, seja na modalidade interpessoal ou institucional.

Embora não seja o foco deste artigo, o legislador reformista passou longe da proteção dos direitos de personalidade do trabalhador brasileiro ao ignorar institutos modernos e importantíssimos como o assédio sexual também.

Perdemos uma oportunidade histórica de concretizar o importante direito fundamental social de proteção à saude mental dos trabalhadores e de podermos comparar a nossa legislação com as de países europeus que há mais de uma década já consagram proteção a tais direitos (Espanha, Suécia, Alemanha, Itália e França).

Pois bem, se o objetivo da Reforma Trabalhista era modernizar as leis trabalhistas, sem dúvida, o tema do assédio moral não poderia ter sido desprestigiado pelo legislador reformista, uma vez que se tratava de um tema moderno, oriundo da 3ª Revolução Industrial (Revolução Tecnológica), apontado com um dos mais preocupantes problemas de saúde mental do século XXI.

Argumentariam algumas vozes isoladas, que numa visão positivista, não tendo regulamentação do assédio moral no Brasil, mesmo após a Reforma Trabalhista, não haveria como combatê-lo no Direito do Trabalho.

Infelizmente, não há na doutrina trabalhista brasileira uma cultura constitucionalista, que de forma predominante busque preservar a vontade da Constituição e efetivar ao máximo seus preceitos e garantias de direitos fundamentais.

Defendemos que a partir da ótica neoconstitucionalista moderna da teoria dos direitos fundamentais, é plenamente possível o combate ao assédio moral interpessoal e institucional, independentemente do desprestígio do legislador brasileiro até hoje.

Em nossa pesquisa jurisprudencial que originou a tese de doutoramento defendida perante a PUC/SP, constatamos que a existência de diversos julgados adotando essa linha de pensamento científico, como por exemplo:

 

ASSÉDIO MORAL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.  CONFIGURADO. Por ofender direitos fundamentais e personalíssimos do empregado, o assédio moral rende ensejo ao dever de indenizar, decorrente da responsabilidade civil subjetiva, que tem como pressupostos a conduta comissiva ou omissiva do empregador, a existência de dano real à vítima e a relação de causalidade entre a conduta do agente e os danos experimentados. Se a prova produzida nos autos demonstra que as práticas de gestão da empresa direcionadas ao cumprimento de metas pelos empregados, estão caracterizadas por políticas mais agressivas de gestão, que reforçam a prática do terror psicológico e, portanto, ultrapassaram os limites da razoabilidade, mister reconhecer a existência de dano moral ao empregado. Recurso da Reclamada conhecido e não provido (00479-2010-013-10-00-6 RO, Casa Bahia Comercial Ltda).

 

 

O autor português Pacheco concorda que o estudo do assédio moral e suas diversas formas deve partir da Constituição de cada país:

“O estudo do assédio moral institucional no trabalho tem forçosamente de incidir sobre a Constituição da República Portuguesa e, mais concretamente, sobre o direito fundamental afectado, principalmente quando se verifica que não existe uma norma no ordenamento jurídico nacional que regule expressamente este grave problema do mundo laboral.[18]

Gutiérrez defende a aplicação da teoria dos direitos fundamentais no Direito do Trabalho: “a Constituição não poderia ficar às portas da fábrica, mas pelo contrário, haveria de estar presente também nas relações entre empresários e trabalhadores[19].

Almeida lembra que: “é atribuída a Palomeque Lopez a feliz expressão de que os direitos da cidadania são também direitos do cidadão-trabalhador, que os exerce como trabalhador-cidadão[20].

O autor explica que os direitos trabalhistas específicos – conhecidos tradicionalmente no Direito do Trabalho – são direitos de segunda geração ou dimensão. Já os direitos inespecíficos são direitos relativos ao exercício da cidadania dos trabalhadores na empresa, portanto classificados como direitos de primeira geração ou dimensão[21].

Santos defende de forma brilhante que:

“Os direitos fundamentais são tão importantes que deveriam possuir no mundo jurídico um papel semelhante a um título executivo constitucional, que uma vez não adimplido propicia a seu possuidor, exigir o seu efetivo cumprimento judicialmente, mesmo que seja em face da expropriação ou constrição dos bens do devedor, no caso o Estado[22]”(grifo nosso).

 

Parece que o legislador reformista lamentavelmente não se preocupou com os direitos de cidadania do trabalhador na empresa e perdemos, sem dúvida, uma grande oportunidade histórica de concretizar este importante direito fundamental social.

Não obstante, nem tudo está perdido, basta aplicar a teoria dos direitos fundamentais numa visão neoconstitucionalista como meio de dar eficácia horizontal nas relações trabalhistas ao direito fundamental social da saúde mental no trabalho e exigir perante o Estado o cumprimento deste importante verdadeiro título executivo constitucional.[24]

 

 

Notas e Referências

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[1] CONSTITUIÇÃO da Organização Mundial da Saúde (OMS/WHO) – 1946. Biblioteca Virtual de Direitos Humanos – USP. Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/OMS-Organiza%C3%A7%C3%A3o-Mundial-da-Sa%C3%BAde/constituicao-da-organizacao-mundial-da-saude-omswho.html>. Acesso em: 1 mar. 2013.

[2]  “ASSÉDIO MORAL – CONTRATO DE INAÇÃO – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. A tortura psicológica, destinada a golpear a auto estima do empregado, visando forçar sua demissão ou apressar sua dispensa através de métodos que resultem em sobrecarregar o empregado de tarefas inúteis, sonegar-lhe informações e fingir que não o vê, resultam em assédio moral, cujo efeito é o direito à indenização por dano moral, porque ultrapassa o âmbito profissional, eis que minam a saúde física e mental da vítima e corrói a sua auto estima. No caso dos autos, o assédio foi além, porque a empresa transformou o contrato de atividade em contrato de inação, quebrando o caráter sinalagmático do contrato de trabalho, e por consequência, descumprindo a sua principal obrigação que é a de fornecer trabalho, fonte de dignidade do empregado.” (Tribunal Regional do Trabalho, 17ª Região, RO nº 1315.2000.00.17.00.1, Ac. nº 2.276/2001, Rel. Juíza Sônia das Dores Dionízio, DJ de 20/08/2002, publicado na Revista LTr 66-10/1237).

[3] GUEDES, Márcia Novaes. Terror psicológico no trabalho. São Paulo: LTr, 2004

[4] GUEDES, 2005, p. 32.

[5] HIRIGOYEN, 2003, p. 65.

[6] EINARSEN, S. et al. The concept of bullying at work: the european tradition. In: ______. (Ed.).  Bullying and emotional abuse in the workplace: international perspectives in research and practice. London: Taylor and Francis, 2003. p. 3-30.

[7] GOSDAL, Thereza Cristina; SOBOLL, Lis Andrea (Org.). Assédio moral interpessoal e organizacional: um enfoque interdisciplinar. São Paulo: LTr, 2009. p. 28.

[8] EINARSEN et al., op. cit., p. 3-30.

[9] GOSDAL; SOBOLL, op. cit., p. 19.

[10] ARAÚJO, 2012, p. 61.

[11] GOSDAL; SOBOLL, 2009, p. 34.

[12] GOSDAL; SOBOLL, 2009, p. 36.

[13] ZABALA, Iñaki Piñuel y. Mobbing: como sobreviver ao assédio psicológico no trabalho. São Paulo: Loyola, 2003.

[14] HIRIGOYEN, 2003, p. 98.

[15] PEREIRA, R., 2009, p. 175-176.

[16] EBERLE, André Davi et al. Assédio moral organizacional: esclarecimentos conceituais e repercussões. In: GOSDAL, Thereza Cristina; SOBOLL, Lis Andrea Pereira (Org.). Assédio moral interpessoal e organizacional. São Paulo: LTr, 2009. p. 27.

[17] CALVO, Adriana. O direito fundamental a saude mental no ambiente do trabalho. São Paulo, Ed. Ltr, 2014.

[18] PACHECO, Mago Graciano de Rocha. O assédio moral no trabalho: o elo mais fraco. Portugal: Almedina, 2007. p. 22.

[19] AMARAL, 2007, p. 80 apud GUTIERREZ, 2001, p. 85-86.

[20] ALMEIDA, Renato Rua de. Direitos laborais inespecíficos dos trabalhadores. Revista LTr, Legislação do Trabalho, São Paulo, v. 76, p. 1, 2012.

[21] ALMEIDA, 2012, p. 1.

[22] SANTOS, 2005, p. 29.

[23] SANTOS, 2005, p. 29.

[24] Expressão utilizada por Santos.

 

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