Publicado originalmente em migalhas.com.br
De acordo com o presidente da Corte, é legítima a cobrança de custas judiciais, em razão da ausência do reclamante à audiência, mediante prévia intimação pessoal para que tenha a oportunidade de justificar o não comparecimento.
Na tarde desta quinta-feira, 14, o plenário do STF retomou julgamento de dispositivos da reforma trabalhista que assentaram a obrigação de pagamento de honorários periciais e advocatícios pela parte derrotada e o pagamento de custas pelo beneficiário da Justiça gratuita que faltar injustificadamente à audiência de julgamento.
O debate foi retomado hoje com o voto-vista do ministro Fux, que seguiu o entendimento do relator do caso, o ministro Barroso, em 2018, nas seguintes teses:
1. O direito à gratuidade de justiça pode ser regulado de forma a desincentivar a litigância abusiva, inclusive por meio da cobrança de custas e de honorários a seus beneficiários.
2. A cobrança de honorários sucumbenciais do hipossuficiente poderá incidir: (i) sobre verbas não alimentares, a exemplo de indenizações por danos morais, em sua integralidade; e (ii) sobre o percentual de até 30% do valor que exceder ao teto do Regime Geral de Previdência Social, mesmo quando pertinente a verbas remuneratórias.
3. É legítima a cobrança de custas judiciais, em razão da ausência do reclamante à audiência, mediante prévia intimação pessoal para que tenha a oportunidade de justificar o não comparecimento.
A ação foi proposta em 2017 pelo então PGR Rodrigo Janot contra as alterações que a reforma trabalhista trouxe. A PGR impugnou os seguintes aspectos:
Honorários periciais e advocatícios contra beneficiário de justiça gratuita;
Pagamento de custas processuais por beneficiário de justiça gratuita.
Leia abaixo os dispositivos impugnados:
“Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que beneficiária da justiça gratuita.
§ 4º Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa referida no caput, ainda que em outro processo, a União responderá pelo encargo.” (NR)
Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% ([…]) e o máximo de 15% ([…]) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. […]
§ 4º Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.
Art. 844.
§2º Na hipótese de ausência do reclamante, este será condenado ao pagamento das custas calculadas na forma do art. 789 desta Consolidação, ainda que beneficiário da justiça gratuita, salvo se comprovar, no prazo de quinze dias, que a ausência ocorreu por motivo legalmente justificável.”
No entendimento da Procuradoria, as alterações impõem “restrições inconstitucionais à garantia de gratuidade judiciária aos que comprovem insuficiência de recursos, na Justiça do Trabalho”.
Início do julgamento e voto vista
Em 2018, o caso começou a ser julgado pelo plenário. Naquela oportunidade, o ministro Luís Roberto Barroso, relator, entendeu que não há desproporcionalidade nas regras questionadas, uma vez que a limitação tem como objetivo restringir a judicialização excessiva das relações de trabalho. Barroso explicou que essa sobreutilização do Judiciário leva, por sua vez, à piora dos serviços prestados pela Justiça e prejudica os próprios empregados, dado que a morosidade incentiva os maus empregadores a faltarem com suas obrigações, buscando acordos favoráveis no futuro. “O Estado tem o poder e dever de administrar o nível de litigância para que permaneça em níveis razoáveis”, afirmou.
Posteriormente, Edson Fachin votou no sentido de julgar a ação totalmente procedente. Ele sustentou que os dispositivos questionados mitigaram em situações específicas o direito fundamental à assistência judicial gratuita e o direito fundamental ao acesso à Justiça. Em seguida, Luiz Fux pediu vista e suspendeu o julgamento.
Disposições proporcionais
Em voto-vista, o presidente da Corte manteve as alterações promovidas pela reforma trabalhista. De acordo com Fux, a lei veio para diferenciar o reclamante trabalhista que passa a dispor de capacidade econômica para arcar com os custos do processo daqueles que não podem fazê-lo, sem prejuízo da própria subsistência. “A gratuidade de justiça não constitui fim em si mesma, mas volta-se a melhor concretização do acesso à Justiça”, explicou.
De acordo com Fux, a ausência histórica de um sistema de sucumbência no processo do trabalho estabeleceu mecanismo de incentivo que resulta na perda de eficiência na Justiça do Trabalho nas ações realmente necessárias.
Luiz Fux entendeu que as alterações da reforma trabalhista são revestidas de “proporcionalidade” e frisou que, após as mudanças, houve redução sensível de ajuizamento de ações: “é o reflexo da racionalização das regras processuais trabalhistas”, destacou. Por fim, o presidente do STF acompanhou o entendimento do relator Barroso.
Processo: ADIn 5.766
Por: Redação do Migalhas